O STF em decisão publicada hoje (02/03/2023), na Ação Originaria, AO 2611, Relator, MIN. ROBERTO BARROSO. Sacramentou que compete ao CNJ regulamentar a realização de alienação judicial, prevendo a exclusividade da realização de leilões por Leiloeiros Publicos, credenciados perante o Órgão Judicial.

Segue abaixo o conteúdo da decisão publicado em 02/03/2023.

 

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Data de Publicação: 02/03/2023

Publicação: 0000 – —: Sr. Advogado, Decisão Final 0000 – AO 2611 Relator(a): MIN. ROBERTO BARROSO AUTOR(A/S)(ES): Associação Brasileira de Gestoras de Alienações Judiciais e Extrajudiciais (abranges) ADVOGADO(A/S): Marcelo Montalvão Machado REU(E)(S): Conselho Nacional de Justiça – CNPJ PROCURADOR(ES): Advogado geral da União REU(E)(S): União PROCURADOR(ES): Advogado-geral da União ASSISTENTE(S): Associação Nacional dos Leiloeiros Judiciais Anjo ADVOGADO(A/S): Jose Lucio Munhoz

DECISAO: Ementa: Direito administrativo e processual civil. Ação Originaria. Conselho Nacional de Justiça. Leiloes Judiciais. 1. Ação originaria ajuizada contra decisão do Conselho Nacional de Justiça que invalidou ato normativo do Tribunal de Justiça de São Paulo que permitia o cadastramento e participação de empresas em leiloes judiciais eletrônicos. 2. Como regra geral, o controle dos atos do Conselho por esta Corte somente se justifica nas hipóteses de (i) inobservância do devido processo legal; (ii) exorbitância das competências do Conselho; e (iii) injuridicidade ou manifesta irrazoabilidade do ato impugnado. 3. Ausência de violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, uma vez que o ato invalidado pelo CNJ tinha natureza normativa. Desnecessidade de intimar todos os eventuais prejudicados pela invalidação do ato normativo fiscalizado pelo CNJ. 4. Razoabilidade da decisão impugnada. Ordem para adequação das normas do TJSP as leis aplicáveis na espécie, que não viola os princípios constitucionais da liberdade econômica, livre concorrência e eficiência, bem como a tutela a inovação. 5. Improcedência dos pedidos. 1. Trata-se de ação originaria ajuizada pela Associação Brasileira de Gestoras de Alienações Judicias e Extrajudiciais – ABRAGES, contra acordão do Conselho Nacional de Justiça – CNJ no Procedimento de Controle Administrativo no 0002997- 82.2020.2.00.0000, em que foram invalidados dispositivos de ato normativo da Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP sobre leiloes e alienações judiciais. 2. A ABRAGES narra que a Associação Nacional de Leiloeiros Judiciais – ANLJ impugnou perante o CNJ as Normas de Serviços da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo acerca da participação de empresas em leiloes judiciais, sob o fundamento de que permitiriam o cadastramento de qualquer pessoa física ou jurídica para realizar leilão judicial eletrônico. O CNJ, apos considerações apresentadas pelo TJSP, acolheu as alegações da ANLJ. Transcrevo a ementa do acordão no PCA no 0002997- 82.2020.2.00.0000, no ponto pertinente com a presente demanda: “PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DE SAO PAULO. RESOLUCAO CNJ N. 236. LEILOEIROS PUBLICOS. ATIVIDADE PRIVATIVA EXERCIDA POR PESSOAS FISICAS DEVIDAMENTE MATRICULADAS NAS JUNTAS COMERCIAIS. IMPOSSIBILIDADE DE REALIZACAO DE LEILOES JUDICIAIS POR ENTIDADES PUBLICAS E PRIVADAS. ATUACAO EXCEPCIONALISSIMA DE OFICIAIS DE JUSTICA OU ESCREVENTES. NECESSIDADE DE ADEQUACAO NORMATIVA. PARCIAL PROCEDENCIA. I – O novo Código de Processo Civil atribuiu ao Conselho Nacional de Justiça a competência para a regulamentação da alienação judicial por meio eletrônico, na forma preconizada pelo art. 882, §1o. II – O art. 1o da Resolução CNJ n. 236 e expresso ao dispor que os leiloes judiciais serão realizados exclusivamente por leiloeiros credenciados perante o órgão judiciário, confirmando o caráter pessoal e privativo da atividade. III – Quando atuam em leiloes judiciais, os leiloeiros são agentes delegados, que gozam de fé publica e responsabilizam-se pessoalmente por danos causados no exercício de suas atribuições. IV – A possibilidade de cadastramento e participação de empresas em leiloes judiciais eletrônicos foi suplantada pelo atual Código de Processo Civil, que deixou a cargo do Conselho Nacional de Justiça a regulamentação especifica. V – O Plenário do CNJ rechaçou expressamente a proposta apresentada por um de seus membros no sentido de permitir a realização de leiloes judiciais por ‘entidades publicas e privadas (gestoras) habilitadas perante o órgão judiciário, acompanhadas por leiloeiro devidamente credenciado em Junta Comercial’. VI – As Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo devem se conformar aos ditames legais de modo a vedar o credenciamento de instituições publicas ou privadas para a realização de alienações judiciais eletrônicas e assegurar que apenas os leiloeiros devidamente habilitados nas Juntas Comerciais realizem tal atividade. VII – Toda a sistemática normativa foi construída a partir da regulamentação da profissão de leiloeiro realizada pelo Decreto n. 21.981/1932, que impõe requisitos bastante claros para o exercício da profissão, restando patente que: i) o leiloeiro deve ser pessoa física, matriculada na Junta Comercial; ii) deve prestar fiança para fazer frente as dividas decorrentes de multas e demais responsabilidades; iii) deve exerce-la pessoal e privativamente. VIII – (…) IX – Procedimento de Controle Administrativo que se julga parcialmente procedente, com determinações.” 3. E contra essa decisão que se insurge a requerente. 4. Preliminarmente, a ABRAGES defende sua legitimidade para a propositura da ação originaria nesta Corte e a competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal para julgar ações ajuizadas contra decisões do CNJ. No mérito, argui (i) ser equivocada a conclusão de que a norma do TJSP teria autorizado o cadastramento de qualquer empresa para realização de leilão judicial por via eletrônica, eliminando a exclusividade dos leiloeiros públicos; e (ii) que o procedimento administrativo deixou de ouvir as entidades que seriam atingidas pela decisão, com afronta ao contraditório, celeridade processual, duração razoável do processo, liberdade econômica, livre concorrência, eficiência administrativa e direito a inovação (arts. 5o, LV, LXXVII, 170, IV, 37, caput, e 126, PU). 5. A requerente declina que “a realização operacional dos leiloes se sofisticou de modo a melhor realizar o seu proposito. Essa nova realidade fez nascer e consolidou uma estrutura bipartida em que os leiloeiros passam a centrar esforços no leilão em si, atividade central, e as gestoras assumem a infraestrutura física capaz de vitalizar, pelo uso da internet, o alcance da atividade”, de modo que os leiloeiros continuam a realizar os leiloes. Sustenta que esse modelo permite investir-se “em sistemas antifraude, em servidores externos, em provedores de internet, em links e nuvens de armazenamento externo, no licenciamento de softwares e em tecnologia local” com “incremento na transparência” e “ganhos de funcionalidade sistêmica”. Nessa linha, defende que seria essencial a oitiva das empresas, entidades e associações que prestam serviços e auxiliam os leiloes judiciais. Pormenoriza, ademais, que as Normas de Serviços da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo não dispensam o leiloeiro ou autorizam a realização de alienação judicial por pessoa diversa, mantendo as gestoras de alienações judiciais nas suas atividades instrumentais. 6. Em pedido liminar, a autora requer a suspensão do Comunicado CG 1.469/2019, que fixou o PRAZO de 15 (quinze) dias para a inativação do cadastro das empresas gestoras. Pleiteia, ao final, a anulação do acordão no PCA no 0002997-82.2020.2.00.0000. 7.

O Conselho Nacional de Justiça prestou informações (doc. 25). Noticiou que a Corregedoria- Geral da Justiça do Estado de São Paulo cumpriu as determinações do CNJ, tendo em razão disso sido arquivado o respectivo PCA (doc. 28, fls. 197-202). 8. A Associação Nacional dos Leiloeiros Judiciais – ANLJ solicitou a intervenção no presente feito, na qualidade de assistente litisconsorcial (doc. 29). Argui que “o que pretende a entidade autora e a permissão para que as empresas dela filiadas prestem os servicos que sao privativos de leiloeiros ” e que “se o leiloeiro vai utilizar uma plataforma eletronica propria ou de terceiro para a realizacao do leilao, isso compete a ele decidir”, devendo o leiloeiro “se responsabilizar pelo sistema eletronico de alienacao por leilao”. Sustenta, ainda, (i) a perda do objeto da presente acao, em razao do cumprimento da orientacao do CNJ pelo TJSP, que alterou seu normativo; (ii) a ilegitimidade da requerente; (iii) a legalidade do procedimento impugnado; e (iv) que a pretensao das empresas gestoras e de se substituirem a atuacao dos leiloeiros. Requer a retificacao do valor da causa. 9. Em 04.10.2021, determinei a intimacao da Uniao para se manifestar acerca do pedido de tutela de urgencia (doc. 42). 10. A Uniao sustenta, preliminarmente, a ilegitimidade ativa da ABRAGES, sob a assertiva de que a determinacao exarada pelo CNJ foi dirigida ao Tribunal de Justica de Sao Paulo, “que realizou a adequacao normativa no exercicio de sua autonomia funcional e administrativa, respeitando-se apenas os ditames legais”. Argui, ademais, nao preenchidos os requisitos de fumus boni iuris, porque o ato impugnado estaria em conformidade com o art. 882 do CPC, arts. 1o da Resolucao no 236/CNJ e arts. 11 e 19 do Decreto no 21.981/1932; e de periculum in mora, porquanto ja escoado o PRAZO para inativacao dos cadastros das empresas gestoras (doc. 45). 11. Indeferi o pedido liminar, por nao reconhecer perigo na demora da prestacao jurisdicional, uma vez que o TJSP ja havia cumprido a decisao do CNJ (doc. 52). Na mesma oportunidade, admiti o ingresso da Associacao Nacional dos Leiloeiros Judiciais (ANLJ) como assistente simples. 12. A ANLJ opos embargos de declaracao contra sua admissao na qualidade de assistente simples. Alegou que requereu o ingresso no feito como assistente litisconsorcial. Aduziu tambem que a decisao embargada fora omissa quanto a impugnacao ao valor da causa (doc. 54). 13. A Uniao ofertou contestacao nos autos (doc. 58). Reiterou as razoes ja apresentadas quando da manifestacao sobre a liminar. 14. Em replica, a autora alegou sua legitimidade ativa para a causa, sustentando que os precedentes indicados pela Uniao nao apresentavam aderencia ao caso. No merito, defende que o leiloeiro continua tendo papel central nos leiloes, havendo apenas um suporte instrumental de informatica oferecido pelas associadas da autora (doc. 66). 15. As partes dispensaram a producao de outras provas, alem dos documentos ja juntados nos autos (docs. 64 e 66). Declarei saneado o feito, dispensando a instrucao probatoria (doc. 70). Em razoes finais, as partes reiteraram as alegacoes ja deduzidas no processo (docs. 71 e 73). 16. Na sequencia, determinei que a ANLJ complementasse suas razoes a respeito de sua relacao juridica com a ABRAGES, autora deste processo (doc. 77). A ANLJ argumentou que as empresas representadas pela autora pretendem exercer as funcoes dos leiloeiros judiciais, cuja representacao ela exercita nos autos. Acrescenta que a autora almeja o reconhecimento de nulidade da decisao proferida em processo administrativo iniciado pela ANLJ (doc. 79). A autora, instada a se manifestar, expressou contrariedade a tese da assistente, defendendo que nao se buscava afetar direitos da ANLJ. Opos-se, tambem, a impugnacao ao valor da causa, defendendo que o litigio nao tem conteudo economico aferivel (doc. 83). 17. A Procuradoria-Geral da Republica (PGR) ofertou parecer pela improcedencia do pedido, com a seguinte ementa (doc. 89): ACAO ORIGINARIA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO NACIONAL DE JUSTICA. COMPETENCIA DO STF. ATO NORMATIVO DE TRIBUNAL DE JUSTICA. LEILOES E ALIENACOES JUDICIAIS. AFRONTA AO CONTRADITORIO E A AMPLA DEFESA. INOCORRENCIA. INJURIDICIDADE OU MANIFESTA FALTA DE RAZOABILIDADE DO ATO IMPUGNADO. INEXISTENCIA. EMBARGOS DE DECLARACAO. MERO INCONFORMISMO. IMPROCEDENCIA DO PEDIDO E DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS. 1. O controle dos atos do Conselho Nacional de Justica pelo Supremo Tribunal Federal e justificado somente em casos de: (i) inobservancia do devido processo legal; (ii) exorbitancia das atribuicoes do Conselho; e (iii) injuridicidade ou manifesta falta de razoabilidade do ato impugnado. 2. Inexiste afronta ao devido processo legal e a seus corolarios do contraditorio e da ampla defesa pela ausencia de notificacao de todos os interessados acerca da existencia, no CNJ, de PCA em que se discute ato normativo que rege leiloes e alienacoes judiciais no ambito de Tribunal de Justica local, uma vez que compete a quem praticou o ato objeto de questionamento a sua defesa administrativa, bem como em razao de o ato administrativo objeto do controle de legalidade pelo CNJ ter natureza generica e objetiva. 3. Inexiste injuridicidade ou manifesta falta de razoabilidade no ato impugnado do CNJ que se limitou a determinar a adequacao de norma de Tribunal de Justica estadual, com base em arcabouco normativo vigente, para assegurar que os leiloes judiciais, presenciais ou eletronicos se realizem exclusivamente por leiloeiros habilitados perante as Juntas Comerciais, sem implicar ofensa ao valor social do trabalho e ao livre exercicio de qualquer trabalho, oficio ou profissao, consagrados nos arts. 1o, IV, e 5o, XIII, da Constituicao Federal. Precedente do STF. 4. E descabida a oposicao de declaracao visando a rediscussao do assentado no julgado por inconformismo da parte embargante, sem a devida indicacao de omissao, contradicao, obscuridade ou erro. 5. Inviavel alterar o valor da causa, com fundamento em suposto beneficio ou prejuizo economico as partes, quando o objeto da acao e desprovido de valor economico, tratando-se de controle de legalidade, exercido pelo CNJ, de natureza generica e objetiva, sem reflexo direto na esfera patrimonial das empresas representadas pela associacao autora. — Parecer pela improcedencia do pedido e pelo desprovimento dos embargos de declaracao. 18. E relatorio. Passo a decidir. 19. No caso em analise, o Conselho Nacional de Justica apreciou a arguicao de invalidade de redacao das Normas de Servico da Corregedoria Geral da Justica do Estado de Sao Paulo que regulavam leiloes e alienacoes judiciais. Em conclusao, o CNJ afirmou que o ato impugnado permitia que empresas gestoras realizassem funcoes exclusivas dos leiloeiros, em descompasso com o art. 882, § 1o, do CPC, arts. 1o, 2o e 10 da Resolucao no 236/CNJ e arts. 1o, 2o, 11, 19 e 36 do Decreto no 21.981/1932. 20. Alem da desconformidade do ato normativo do TJSP com os dispositivos acima indicados, o CNJ verificou a existencia de pessoas juridicas cadastradas como leiloeiros no Portal de Auxiliares da Justica daquele Tribunal. Somados os elementos, julgou parcialmente procedente o Procedimento de Controle Administrativo em referencia, determinando ao TJSP que promovesse a adequacao das Normas de Servico da Corregedoria-Geral de Justica: “Ao permitir que entidades publicas ou privadas realizem alienacao judicial eletronica, a norma da Corregedoria Geral da Justica paulista contraria todo o arcabouco normativo acerca da materia e usurpa a exclusividade que foi atribuida aos leiloeiros publicos para a realizacao das alienacoes judiciais eletronicas. Importante sobrelevar, em principio, que a possibilidade de cadastramento e participacao de empresas em leiloes judiciais eletronicos foi suplantada pelo atual CPC. (…) Ha informacoes de que, “na operacionalizacao dos credenciamentos de leiloeiros, a grande maioria dos Tribunais optaram por credenciar empresas gestoras de leilao eletronico, com amparo no artigo 689-A do CPC [entao] vigente, exigindo que tais empresas apresentassem, por ocasiao do credenciamento, o nome do leiloeiro oficial que atuaria na realizacao dos leiloes judiciais eletronicos.” Todavia, conforme redacao do art. 882 do novo CPC, anteriormente transcrita, essa possibilidade foi extinta, deixando a cargo do Conselho Nacional de Justica a regulamentacao especifica. E, como se viu, este Conselho reafirmou em sua Resolucao o carater privativo da atividade. (…) Vale colacionar o exemplo de Tribunais que editaram disposicoes complementares consentaneas com a Resolucao CNJ n. 236. Ao regulamentar “o credenciamento de leiloeiros publicos e corretores para a realizacao de leilao judicial, nas modalidades eletronica, presencial e simultanea, bem como de alienacao particular”, o Tribunal de Justica do Distrito Federal e Territorios estabeleceu acertadamente a exigencia de habilitacao apenas de pessoas fisicas, nos termos da Portaria GC n. 188 de 11 de novembro de 2016. De igual forma, no Tribunal de Justica do Estado de Minas Gerais, a Resolucao n. 882/2018, do Orgao Especial, estabelece expressamente: (…) A ilegalidade dos dispositivos impugnados das Normas de Servico da Corregedoria-Geral da Justica do Estado de Sao Paulo e patente. Ao mesmo tempo em que afirma que a interpretacao da norma deve ser sistemica, que “nao ha dispensa do leiloeiro para a realizacao da alienacao judicial” e que, em “se tratando de leilao exclusivamente eletronico, a presenca e dispensada, mas nao a atuacao do LEILOEIRO PUBLICO, unico apto a realizar a alienacao judicial eletronica, conforme diretrizes estabelecidas pelo CNJ e Codigo de Processo Civil” (grifo nosso), o TJSP revela que a realizacao do leilao por entidades publicas ou privadas somente sera “autorizada, caso o quadro societario conte com a presenca de um LEILOEIRO PUBLICO com registro perante a Junta Comercial” (grifo nosso) Alem de serem ilegais, as disposicoes das Normas da Corregedoria citadas fragilizam o sistema protetivo e punitivo imposto pelo Decreto n. 21.981/1932, pelo CPC e pela Resolucao CNJ n. 236. A apuracao de responsabilidades e a atuacao da Junta Comercial, do juiz e do proprio Tribunal ficam comprometidas. Questiona-se: nos casos em que se permitiu o credenciamento de empresa, quem e o leiloeiro supostamente responsavel? Qual e o numero de sua matricula na Junta Comercial? A gestao do sistema de alienacao judicial eletronica e exercida pelo leiloeiro, pela empresa credenciada ou por empresa diversa? De todo o exposto, nao restam duvidas quanto a necessidade de o Tribunal requerido promover a adequacao das Normas de Servico da Corregedoria-Geral da Justica do Estado de Sao Paulo aos ditames legais, vedando o credenciamento de instituicoes publicas ou privadas para a realizacao de alienacoes judiciais eletronicas e assegurando que apenas os leiloeiros devidamente habilitados nas Juntas Comerciais realizem tal atividade. (…) III. CONCLUSAO Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o presente Procedimento de Controle Administrativo para determinar ao Tribunal de Justica do Estado de Sao Paulo que, no PRAZO de 90 (noventa) dias, promova a adequacao das Normas de Servico da Corregedoria-Geral da Justica aos ditames legais: i) vedando o credenciamento de instituicoes publicas ou privadas para a realizacao de alienacoes judiciais eletronicas e assegurando que apenas os leiloeiros devidamente habilitados nas Juntas Comerciais realizem tal atividade; ii)(…).” (Destaquei). 21. O referido acordao foi publicado em 10.03.2021. Conforme informacoes prestadas e consulta ao acompanhamento processual eletronico, o CNJ foi notificado, em 13.05.2021, de que o Tribunal de Justica do Estado de Sao Paulo dera cumprimento a deliberacao supracitada, alterando a redacao das normas de seus servicos auxiliares: “Em cumprimento a deliberacao do CNJ, a Corregedoria-Geral da Justica do Estado de Sao Paulo – CGJSP encaminhou copias do parecer de fl. 144/167 e da decisao de fl. 179/183 (…), bem como dos Provimentos no 19/2021 da Corregedoria-Geral da Justica e no 2614/2021 do Conselho Superior da Magistratura do E. Tribunal de Justica, das quais destaca-se as seguintes alteracoes: i) alteracao da redacao do caput e revogacao do §2o do artigo 251 das Normas da Corregedoria para contemplar a atuacao exclusiva dos leiloeiros publicos, devidamente cadastrados no Portal dos Auxiliares, permitindo “maior seguranca a atividade desempenhada, com a comprovacao do efetivo exercicio e matricula perante a Junta Comercial do Estado de Sao Paulo”; ii) inclusao de dois novos artigos que passarao a ter a numeracao 251-A e 251-B, e de paragrafo unico ao artigo 274, viabilizando o cadastro do leiloeiro e a conferencia dos documentos e dados fornecidos e regulamentando a contratacao, sob exclusiva responsabilidade do leiloeiro, de “empresas de tecnologia destinadas a prestar auxilio na realizacao dos leiloes que sempre serao conduzidos pela pessoa fisica do leiloeiro”; iii) alteracao da redacao do caput do artigo 254 para a exclusao da possibilidade de realizacao dos leiloes por entidades publicas ou privadas; iv) alteracao da redacao do caput do artigo 269 para anotar a expressao “LEILOEIRO PUBLICO” na elaboracao do auto de arrematacao; v) inclusao de paragrafo unico ao artigo 278 para estabelecer regras relativas ao descredenciamento de leiloeiros publicos; vi) alteracao da redacao do caput e dos §§ 1o e 3o do artigo 282, bem como do inciso V do artigo 994 e do caput do artigo 1089, para contemplar a possibilidade excepcional de realizacao dos leiloes por Oficiais de Justica e Escreventes; e vii) revogacao do Provimento CSM n. 1.625/2009 para impedir a veiculacao na pagina eletronica do TJSP da possibilidade de realizacao de leilao por empresas gestoras.” 22. Embora a decisao do CNJ ja tenha sido cumprida, esvaziando eventual utilidade no deferimento de liminar, entendo que ainda subsiste a controversia principal, sobre como as empresas gestoras de leiloes podem participar das hastas publicas em processo judicial. Assim, nao esta prejudicada a presente demanda, cabendo dar sequencia a seu julgamento. 23. Aprecio, inicialmente, as preliminares. A competencia desta Corte para o processamento e julgamento desta acao ja esta bem delineada na jurisprudencia. Com efeito, no julgamento da ADI 4.412 (Rel. Min. Gilmar Mendes), o Plenario do STF determinou a remessa imediata ao Tribunal de todas as acoes ordinarias, em tramite na justica federal, que impugnem atos do CNJ praticados no ambito de suas competencias constitucionais, com base na seguinte tese de julgamento: “Nos termos do artigo 102, inciso I, r, da Constituicao Federal, e competencia exclusiva do Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, todas as acoes ajuizadas contra decisoes do Conselho Nacional de Justica e do Conselho Nacional do Ministerio Publico proferidas no exercicio de suas competencias constitucionais, respectivamente, previstas nos artigos 103- B, § 4o, e 130-A, § 2o, da Constituicao Federal”. 24. Afasto, ademais, os argumentos da ANLJ quanto a sua intervencao no processo na qualidade de assistente litisconsorcial. No caso, nao ha relacao juridica entre a ANLJ e a ABRAGES. A controversia diz respeito ao grau de participacao das empresas gestoras de leiloes em leiloes judiciais. Esse conflito de interesses, embora tenha efeitos reflexos nos associados da assistente, decorre de atuacao do CNJ, que teria prejudicado os direitos alegados pela autora. Nao se controverte nos autos sobre o direito dos leiloeiros em conduzir as hastas publicas, mas quanto ao direito de empresas participarem da organizacao destas atividades. Assim, o julgamento desta causa nao atingira diretamente a relacao juridica entre os leiloeiros e as empresas gestoras. 25. Rejeito, igualmente, a impugnacao ao valor da causa, uma vez que o processo trata de questao sem conteudo economico diretamente aferivel. Entendo ser razoavel o valor atribuido pela autora. Superadas as preliminares quanto a competencia, a assistencia e ao valor da causa, prossigo na analise do merito. 26. Em questoes tecnicas, como a presente, tenho reiterado o entendimento de que a intervencao do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre atos praticados pelo CNJ deve ocorrer em carater excepcionalissimo. Isso porque, suas decisoes devem ser revistas com a deferencia que os orgaos constitucionais de natureza tecnica merecem, evitando-se ingerencia desnecessaria ou indevida. 27. Nessa linha, o controle dos atos do CNJ por parte desta Corte somente se justifica em hipoteses de anomalia grave, entre as quais: (i) inobservancia do devido processo legal; (ii) exorbitancia, pelo Conselho, de suas competencias e (iii) injuridicidade ou manifesta falta de razoabilidade do ato. 28. No caso, nao estao configuradas tais hipoteses. Isso porque o ato do CNJ nao ofendeu o devido processo legal, nao exorbitou de suas competencias, tampouco incorreu em injuridicidade. 29. No que se refere ao devido processo legal, a jurisprudencia desta Casa se firmou no sentido de que a ausencia de natureza subjetiva na materia discutida pelo orgao de controle do Poder Judiciario afasta a necessidade de notificacao dos eventuais interessados na decisao. Apenas o orgao judicial que editou a norma tem legitimidade para figurar no polo passivo do procedimento administrativo. Na hipotese, a pretensao deduzida perante o CNJ tinha por objeto ato do TJSP, ainda que sua decisao apresentasse reflexos na atuacao da autora. Vejam-se os precedentes nesse sentido: EMENTA Agravo regimental em mandado de seguranca. Falta de impugnacao dos fundamentos da decisao agravada. Conselho Nacional de Justica (CNJ). Pedido de providencias. Falta de notificacao dos interessados. Ofensa a garantia do contraditorio e da ampla defesa. Nao configuracao. Ato controlado de carater normativo geral e objetivo. Deliberacao do Conselho cujos efeitos sao uniformes para todos. Inexistencia de resultado util na oitiva dos beneficiarios do ato. Agravo regimental nao provido. 1. A jurisprudencia do Supremo Tribunal Federal e firme no sentido de que nao subsiste o agravo regimental em que se deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisao monocratica (art. 317, § 1o, RISTF). Precedentes. 2. A garantia do contraditorio e da ampla defesa nao se da como um fim em si mesmo, mas sempre com vista a possibilidade de assegurar um resultado util, o que nao se verifica in casu. Sendo o ato administrativo controlado de carater normativo geral e objetivo, nao se revela razoavel se exigir do CNJ a oitiva dos interessados quando nenhuma consideracao a eles pertinente se revela util ao deslinde da questao, somente para se assegurar a participacao formal deles. Nao configurada a alegada ofensa a garantia do contraditorio. Precedente: MS no 26.739/DF, Segunda Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, DJ de 14/6/16. 3. Agravo regimental nao provido. (MS 34260 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 09/12/2016, PROCESSO ELETRONICO DJe-030 DIVULG 14-02-2017 PUBLIC 15-02-2017) EMENTA AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANCA. INTERPOSICAO SOB A EGIDE DO CPC/1973. CONSELHO NACIONAL DE JUSTICA. SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO. OUTORGA DE DELEGACAO A SUBSTITUTO, SEM CONCURSO PUBLICO. SUSTENTADA OFENSA AS GARANTIAS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITORIO E DA AMPLA DEFESA. 1. A jurisprudencia deste Supremo Tribunal Federal, atenta a viabilidade operacional dos orgaos de controle (Tribunal de Contas da Uniao, Conselho Nacional de Justica, Conselho Nacional do Ministerio Publico etc.), e a acertada delimitacao das garantias constitucionais de natureza procedimental, firma-se no sentido de que, na hipotese de a atuacao de instituicoes fiscalizatorias envolver apuracao de espectro amplo, voltada a promocao de ajuste da conduta de entes ou orgaos fiscalizados aos ditames legais, sem deliberacao imediata sobre situacoes especificas, nao ha necessidade de intimacao, no ambito interno do orgao de controle, de cada um dos potenciais interessados nos desdobramentos da decisao administrativa generica a ser proferida. Precedentes. 2. Em tais hipoteses, incumbira ao orgao ou ente fiscalizado, no intuito de verificar a subsuncao de casos especificos ao genericamente determinado pelo orgao de controle, instaurar, posteriormente, em seu perimetro, contraditorio individualizado e observar as demais garantias de indole procedimental. 3. No caso em tela, ante o carater geral da apuracao empreendida no PCA no 2008.10.00.000885-5, impoe-se concluir, na ausencia de objeto de deliberacao suscetivel de causar, de forma direta e imediata, gravame aos impetrantes, que nao havia necessidade de que estes fossem intimados, pessoalmente ou por meio de advogado, a respeito da data designada para o julgamento no Conselho Nacional de Justica, facultado, por obvio, o acompanhamento voluntario do referido processo administrativo, que, segundo se extrai dos documentos acostados aos autos, sempre contou com publicidade adequada. 4. Ainda que se reputasse devida a previa intimacao dos impetrantes no mencionado PCA, pessoalmente ou por seu advogado, forcoso seria concluir, presente a diretriz tracada no brocardo “pas de nullite sans grief”, que a decretacao de nulidade por cerceamento de defesa exigiria demonstracao de prejuizo concreto, o que nao ocorreu, considerada a natureza generica da decisao proferida pelo CNJ, limitada a determinar a observancia, pelo Tribunal de Justica do Estado do Espirito Santo, autoridade delegante, da exigencia constitucional de concurso para ingresso e remocao na atividade notarial e de registro, sem redundar em imediata desconstituicao de delegacoes especificas, providencia deixada a cargo da Corte estadual capixaba, apos exame individualizado de cada situacao. Agravo regimental conhecido e nao provido. (MS 27571 AgR-segundo, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 03/05/2016, PROCESSO ELETRONICO DJe-197 DIVULG 14-09- 2016 PUBLIC 15- 09-2016) 30. No presente caso, o CNJ atuou como fiscalizador da regularidade administrativa das normas editadas pelo TJSP. Dessa forma, nao ha necessidade de determinar a intimacao de cada um dos potenciais interessados nos desdobramentos do procedimento de controle, sob pena de inviabilizar qualquer tipo de fiscalizacao feita pelo Conselho. Desse modo, nao houve no PCA no no 0002997-82.2020.2.00.0000 violacao ao principios do devido processo legal, do contraditorio e da ampla defesa, em razao da ausencia de intimacao da autora para participar daquele procedimento. 31. Quanto a alegada violacao material dos principios constitucionais da liberdade economica, livre concorrencia e eficiencia, bem como a tutela a inovacao, tambem entendo que nao devem prosperar as razoes da autora. O CNJ decidiu o caso a luz das normas aplicaveis, especificamente o art. 882, § 1o, do CPC, o Decreto no 21.981/1932 e a Resolucao no 236/CNJ. 32. O art. 882, § 1o, do CPC estabelece que compete ao CNJ regulamentar a realizacao de alienacao judicial por meio eletronico. No exercicio dessa competencia, o Conselho editou a Resolucao no 236/2016, que, em observancia ao Decreto no 21.981/1932, previu a exclusividade da realizacao de leiloes por leiloeiros publicos credenciados perante o orgao judiciario. 33. Portanto, o CNJ, ao editar o ato impugnado, nao procedeu de forma manifestamente desarrazoada. Ao contrario, deu adequado cumprimento a legislacao pertinente, exercendo sua competencia tecnica para regulamentar atos administrativos do Poder Judiciario. Dessa forma, nao se mostra cabivel revisar tal decisao, no ambito judicial. 34. Em face do exposto, julgo improcedente o pedido. Prejudicados os embargos de declaracao da assistente. Custas pela autora. Fixo os honorarios em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do art. 85, § 8o do CPC). Publique-se. Intimem-se. Brasilia, 1o de marco de 2023. Ministro Luis Roberto Barroso Relator